02 Jun Pandemia decreta novos tempos para a prática desportiva
O combate à pandemia do COVID-19 ditou medidas de confinamento que implicaram restrições à mobilidade e isolamento social. O impacto sentiu-se, também, no contexto desportivo. São disso exemplo o adiamento dos Jogos Olímpicos e dos Jogos Paralímpicos de 2020 para 2021, o término das competições de diferentes modalidades, o condicionamento do normal funcionamento de ginásios, federações desportivas, ligas profissionais e associações territoriais de clubes.
«Contudo, este período de confinamento parece ter servido de alavanca para, em alguns casos, aumentar os hábitos de prática de actividade física, provavelmente resultado de uma maior disponibilidade temporal para o efeito», constata o investigador Eduardo Abade, especialista em treino de força e condição física.
Seis em cada dez consumidores reconhecem que começaram a praticar mais exercício físico em casa e mais de metade dos inquiridos (57%) assume que está a praticar mais desporto, de acordo com um estudo que envolveu mais de três mil pessoas em 15 países dos cinco continentes. No início de Abril, a Direcção-Geral da Saúde avançou, também, com um estudo para conhecer os comportamentos alimentares e de actividade física dos portugueses em contexto de contenção social para que se possam definir estratégias para mitigar os impactos da pandemia nessas áreas.
Apesar da massificação de plataformas e canais de informação emergentes, sobretudo em ambiente digital, o investigador do CIDESD alerta que «é extremamente importante que as pessoas se refugiem em informação credível e fidedigna promovida pelas entidades públicas competentes e profissionais da área do exercício físico e saúde».
«Este princípio deve ser igualmente respeitado no âmbito do treino desportivo, onde as características da modalidade e as necessidades individuais de cada praticante requerem, ainda que à distância, um acompanhamento permanente e rigoroso que permita atenuar as perdas (inevitáveis) nos perfis de rendimento e preparar o regresso a rotinas de treino integradas em cenários mais próximos da realidade competitiva», acrescenta.
O campeonato português de futebol regressa a 4 de Junho, uma retoma que já aconteceu em países como Alemanha, Hungria, República Checa, Dinamarca, Croácia, Israel, Ucrânia. Paralelamente, Holanda, França ou Luxemburgo optaram por cancelar as competições.
Eduardo Abade considera que este período de confinamento, em parte análogo aos tradicionais períodos de transição entre épocas desportivas, «obrigará à realização de um novo momento pré-competitivo que assegure a retoma de perfis físicos de elevado nível».
Confinamento alavanca novas investigações
A prevenção de lesões e a salvaguarda da saúde dos desportistas é sempre um tema apetecível para investigadores e um ponto de extrema relevância para os agentes de cada modalidade. Por isso, num contexto de pós-confinamento importa observar e avaliar a taxa de incidência e o grau de severidade das lesões. «Começam a surgir sinais preocupantes (e até expectáveis) que nos obrigam a repensar os modelos de transição nestes contextos. A prevenção de lesões não é feita de packs de exercícios e/ou momentos específicos do ciclo anual de treino. Tudo, literalmente tudo o que fazemos, terá influência na ocorrência de lesões», sublinha Eduardo Abade.
A duração/enquadramento das sessões de treino, os critérios de selecção/manipulação dos exercícios, o contexto colectivo/individual de treino, o histórico de cargas/necessidades individuais do sujeito são elementos de «uma abordagem holística e ecológica» que deve ser «respeitada sistematicamente».
«Esta perspectiva torna claro que, apesar das boas intenções e melhores práticas, nunca se preveniu tão pouco as lesões como neste período de confinamento. Não por culpa dos treinadores e jogadores, mas simplesmente porque o contexto nunca antes vivido retirou parte da abordagem holística necessária», constata.
Abrem-se, assim, novas oportunidades para o mundo da investigação procurar respostas que ajudem a estabelecer guias de regresso à prática desportiva que assegurem «patamares elevados de rendimento e saúde dos praticantes desportivos».
«Numa era em que muitos clubes manifestam dificuldade em controlar adequadamente os seus atletas fora do período normal de treino, fica um tempo e espaço de oportunidade para o desenvolvimento de novos métodos e recursos tecnológicos de monitorização e para aprimorar alguns já existentes. Isso pode ser benéfico no upgrade de instrumentos e procedimentos de avaliação e controlo de cargas, recuperação, sono e estratégias nutricionais num futuro próximo», conclui.